segunda-feira, 31 de agosto de 2009

OS MAKONDES E SUAS ESCULTURAS EM PAU PRETO.



Os Makondes são um povo da África oriental que habitam os planaltos do norte de Moçambique e sul da Tanzânia.
Têm como atividades principais, a agricultura e a escultura, sendo apreciados e conhecidos mundialmente pelas suas belas máscaras e esculturas em madeira, que refletem a sua estética e rica cultura.
Os Makondes, em sua grande maioria, mantêm uma religião tradicional embora parte da população seja hoje cristã.Eles são um povo Bantu provavelmente originário de uma zona a sul do lago Niassa – Na fronteira entre Moçambique, Malawi e Tanzania. A hipótese desta origem foi apurada a partir da análise de fontes escritas e orais, e é ainda reforçada por semelhanças culturais com o povo Chewa, que ainda hoje habita uma vasta zona a sul e sudoeste do lago Niassa, no Malawi e na Zâmbia.
Mantiveram-se muito isolados até tarde, pois só no século XX é que os portugueses, que na altura colonizavam Moçambique, conseguiram controlar as zonas por eles habitadas. A isto se deve à sua localização, protegida por zonas ingremes de difícil acesso e por florestas densas. Fato este de os Makondes terem ganho uma imagem de violentos e irrascíveis que também ajudou ao seu isolamento.
Desta forma, conseguiram manter uma forte coesão cultural, que apesar de ter diminuido nos anos que se seguiram à chegada dos portugueses, ainda assim conseguiu resistir em vários aspetos. Também a religião tradicional se manteve dominante, tendo as conversões ao cristianismo começado apenas por volta de 1930.
Falando um pouco de suas esculturas, hoje em dia a maior fonte de renda deste povo,todos os tipos de objetos são feitos com grande sensibilidade estética e demonstram um amor pela beleza;
Os Makondes, assim como muitos outros povos, dão muita importância aos ritos de passagem, sendo os mais importantes os ritos de iniciação masculina e feminina. E ligada aos ritos de iniciação masculina, está a mais importante dança dos Makondes, o Mapico, onde são usadas máscaras com o mesmo nome.
Esta dança é muito importante na vida dos Makondes de Moçambique, havendo uma aura de mistério e segredo rodeando a preparação das máscaras e a dança propriamente dita, sendo, por exemplo, importante que não se saiba a identidade do dançarino.
Para a dança, um jovem mascara-se de homem ou animal, vestindo panos e usando uma máscara Mapico na cabeça. Existem vários passos que o dançarino executa, sempre em sintonia com a música dos tambores, apresentando uma espécie de encenação teatral, que encanta e diverte todos os que assistem.
Depois de um extase de atividade por parte do dançarino, segue-se uma encenação de perseguição e fuga, entre o dançarino e um grupo de aldeões.
O Mapico é o centro das festas tradicionais, em que são realizadas as cerimónias de iniciação.
Depois da chegada dos portugueses às áreas Makondes, muito rapidamente as autoridades coloniais e os missionários, se aperceberam do grande talento e técnica dos artistas, e usaram esse talento para satisfazer os seus interesses, dando origem a esculturas de Cristo, virgens e bustos do ditador Salazar, do poeta Camões, Alexandre Herculano, e de outras individualidades da história portuguesa.
Também surgiram esculturas tipificadas, tais como: o fumador de cachimbo, o caçador, o lavrador, a mulher transportando água, a mulher pilando alimentos, etc.
O interesse por esta produção de esculturas foi tão grande que levou a uma maior organização da produção, com diversificação e criação de novos temas.
Este fenômeno mudou por completo o mundo do escultor Makonde, que passou de camponê a um artista quase a tempo inteiro.
Apesar destas mudanças importantes e do impacto da cultura exterior na sociedade Makonde, a tradição continua a ter muita força e a enquadrar a vida dos artistas, que continuam a cumprir os seus deveres na sociedade tradicional.
Aconteceram grandes alterações econômicas e sociais nas últimas décadas na sociedade Makonde, que no entanto tem conseguido adaptar-se relativamente bem às mudanças e manter um saudável equilibrio.

Saudações Florestais !

domingo, 30 de agosto de 2009

FOLIA DE REIS.

Em nome de Deus pedimos
Que tu sejas batizado
Os três Reis são os padrinhos
Que recebem o afilhado

Sua promessa estácumprida
Os três Reis estão presentes
Seu filho será guiado
Pelos Magos do Oriente.

O Reisado foi introduzido no Brasil-Colônia pelos portugueses no século XIX. É um espetáculo popular das festas de Natal e Reis, cuja ribalta é a praça pública, a rua, mas as vezes pode ser apresentado em residências.

Folia de Reis ou Reisado ou ainda Terno-de reis constitui um dos mais originais folguedos da nossa cultura popular.
É uma folia conhecida em Minas Gerais, Goiás, São Paulo, Paraná, Rio de Janeiro, Espírito Santo .
No interior, é uma dança do período natalino em comemoração ao nascimento do Menino Jesus e em homenagem aos Reis Magos: Gaspar, Melchior e Baltazar, que levaram ouro, incenso e mira, que representam as três dimensões de Cristo (realeza, divindade e humanidade).

Esta festa tem sua origem primária na Festa do Sol Invencível, comemorada pelos romanos e depois adotada pelos egípcios. A festa romana era comemorada em 25 de dezembro (calendário gregoriano) e a egípcia em 6 de janeiro. No século III, ficou estabelecido que dia 25 de dezembro se festejaria o nascimento de Cristo e 6 de janeiro, dia dos Reis.

A característica principal do reisado está no uso de muitos adereços, trajes com cores quentes e chapéus ricamente enfeitados com fitas coloridas e espelhinhos.
O reisado é composto de 4 a 6 mascarados que dão vida, hilaridade e rebuliço é brincadeira. Eles também devem proteger o Menino Jesus e confundir os soldados de Herodes. Acrobatas e declamadores, representam os soldados perseguidores do Menino. Tem ainda: rei, mestre-sala, alferes, a burrinha, o boi, o Jaraquá, a arara, o caipora, a ema, etc. Muitos outros personagens podem aparecer, dependendo da região em que esta festa é realizada. Todos acompanham uma bandeira, estandarte da folia, um quadrado de madeira com a Adoração dos Magos, ornamentada com flores e espelhos, carregada pelo alferes.

Na andanças pelos locais programados, não passam por baixo de varal de roupa, dá azar.
Se precisarem atravessar uma cerca de arame, não passam os instrumentos por baixo da cerca, eles perdem o som.
Se durante o "giro" precisarem consertar ou manter em ordem os instrumentos, têm o cuidado de não deixar no local nenhum resto de material usado nem do próprio instrumentos (por exemplo, pedaços de corda da viola), alguém pode empregar esses restos para fazer algum mal.

sábado, 29 de agosto de 2009

BRINCADEIRAS-DE-RODA.

Pode parecer curioso para alguns falar em cantigas-de-roda nos dias de hoje em tempos em que estas manifestações da cultura popular espontânea estão com o seu espaço tão diminuído. Nas ruas, nas praças, nos quintais está mais raro de se ver ou ouvir-se das bocas infantis aquelas canções que, na simplicidade das suas melodias ritmos e palavras, guardam séculos de sabedoria e a riqueza condensada do imaginário popular .
Porém, mesmo sem estarem em alta, também não estão extintas. E configurando uma situação contrastante e quase contraditória, elas sobrevivem à era do computador. Talvez como um reflexo da busca do contato com a expressão genuína e ancestral que é, em última instância, insubstituível.
O fato é que toda esta conjuntura não altera em nada
o teor valoroso intrínseco as cantigas e brincadeiras-de-roda. Elas continuam contendo símbolos fecundadores de toda a vida subjetiva, e continuam funcionando como pretextos maravilhosos para a criança experimentar o seu corpo, a linguagem, e para descobrir-se a si própria ao mesmo tempo se revelando ao outro e inserindo-se no convívio social.
Segundo Câmara Cascudo (1988), as rodas infantis que se apresentam no Brasil têm origem portuguesa, francesa e espanhola. Porém com a força do cantar e ouvir, abrasileiraram-se muitos destes cantos, sendo eles hoje tão nossos como se aqui nascidos.
Observando um grupo de crianças brincando espontaneamente com estas canções, ou, mergulhando no tempo e nos recordando das brincadeiras-de-roda vivenciadas na própria infância, percebo que algo precioso se proce
ssa. Trata-se de um movimento de entrega, de alegria e de intensidade vital.
Do ponto de vista pedagógico, estes jogos infantis são considerados completos: brincando de roda a criança exercita naturalmente o seu corpo, desenvolve o raciocínio e a memória, estimula o gosto pelo canto. Poesia, música e dança unem-se em uma síntese de elementos imprescindíveis a educação global.
Assim, ocorre que, cantando e dançando no grupo de brincadeiras, a criança traz elementos do passado da humanidade para o seu presente, a partir da vivência deste passado relacionado aos conteúdos do seu presente, encontra-se em
condições de projetar o seu futuro.

São exemplo de algumas:

"Cai, cai balão
Aqui na minha
mão.
Não vou lá!
Não vou lá !
Não vou lá!
Tenho medo de apanhar."

..............................

"Bam-ba-la-lão
Senhor capitão
Espada na cinta
Sinete na mão."
...............................
"Ciranda, cirandinha, vamos todos cirandar
Vamos dar a meia volta, volta e meia vamos dar..."
...............................

"Como pode peixe vivo
Viver fora d'àgua fria?

Como poderei viver

Sem a tua companhia?
...............................

"...O anel que tu me deste
era vidro e se quebrou.
o amor que tu me tinhas
era pouco e se acabou..."
................................

"Nesta rua, nessa rua
Tem um bosque
Que se chama
Que se chama solidão.

Dentro dele

Dentro dele mora um anjo
Que roubou
Que roubou meu coração..."
..........................................

"A carrocinha pegou
Três cachorros de uma vez
Tra lá lá
Que gente é essa?
Tra lá lá
Que gente má!"
.........................................
"Samba Lelê está doente
Está com a cabeça quebrada
Samba Lelê precisava

De umas dezoito lambadas

Samba, samba, samba o Lelê
Pisa na barra da saia, o Lelê!

Ô morena bonita,
Como é que se namora
Põe o lencinho no bolso,
Deixa a pontinha de fora"
..........................................

"Pai Francisco entrou na roda
Tocando seu violão
Dararão, dão, dão !
Vem de lá seu delegado,
E pai Francisco
Vai para a prisão.

Como ele vem
Todo requebrado

Parece um boneco
Desengonçado!"
.............................................
"Ai eu entrei na roda
Ai eu não sei como se dança
Ai eu entrei na roda dança
Ai eu não sei dançar

Sete e sete são quatorze
Três vez sete é vinte-e-um
Tenho sete namorados

Só posso casar com um"
...................................................

"A linda Rosa juvenil, juvenil, juvenil,
A linda rosa juvenil, juvenil

Vivia alegre no seu lar, no seu lar, no seu lar
Vivia alegre no seu lar, no seu lar.


Mas uma feiticeira má, muito má, muito má
mas uma feiticeira muito má, muito má

Adormeceu a Rosa assim, bem assim, bem assim...
Adormeceu a Rosa assim, bem assim...

Não há de acordar jamais, nunca mais, nunca mais
Não há de acordar jamais, nunca mais.

O tempo passou a correr, a correr, a correr,
o tempo passou a correr, a correr

E o mato cresceu ao redor, ao redor, ao redor
E o mato cresceu ao redor, ao redor

Um dia veio um belo rei, belo rei, belo rei

Um dia veio um belo rei, belo rei

Que despertou a rosa assim, bem assim, bem assim
Que despertou a Rosa assim, bem assim."
.............................................................
"A canoa virou
Por deixar ela virar.
Foi por causa da Fulana
Que não soube remar

Ai se eu fosse um peixinho
E soubesse nadar

Tiraria a Fulana
Lá do fundo do mar ".

..................................................
"...o anel que tu me destes era vidro e se quebrou
o amor que tu me tinhas era pouco e se acabou..."
..................................................
"Terezinha de Jesus, de uma queda foi-se ao chão
acudiram três cavaleiros, todos três chapéu na mão
o primeiro foi seu pai..."

Saudações Florestais !



sexta-feira, 28 de agosto de 2009

TUDO PELO VERDE.





"As árvores são fáceis de achar

Ficam plantadas no chão

mamando do sol pelas folhas
E pela terra.
Também bebem á água,
cantam no vento
E recebem a chuva de galhos abertos"


(As Árvores - Arnaldo Antunes e Jorge Ben Jor)


Elas nos alimentam com seus frutos, nos protegem sob suas copas, nos encantam som suas flores. Resistem ao vento, acolhem os humores do clima, recebem o rigor da tempestade e a crueldade das motosserras. São as mães da natureza. Guarde sempre um minuto para celebrar a beleza e o poder dessas criaturas que representam a generozidade da criação. Muito se fala da necessidade de preservar a Amazônia, o que é fundamental. Não se pode esquecer, porém, das urgências do ambiente urbano, que concentra hoje a maioria da população, em todo mundo.
A beleza de uma árvore florida toma conta dos olhos e da alma.
É impossível não se emocionar.


Eu amo as árvores.


O mundo depende das árvores para manter o ciclo das águas, a temperatura, o estoque de alimentos e a estabilidade ecológica.


Quem ama cuida.



"O homem, a fera e
o inseto à sombra
delas vivem, livres
da fome e de fadigas, e em seus
galhos abrigam-se
as cantigas
e os amores das
aves tagarelas"

(Velhas Árvores - Olavo Bilac )



Saudações Florestais !

terça-feira, 25 de agosto de 2009

UM ESPINHO DE MARFIM.

Amanhecia o sol e lá estava o unicórnio pastando no jardim da Princesa. Por entre flores olhava a janela do quarto onde ele vinha cumprimentar o dia. Depois esperava vê-la no balcão, e, quando o pezinho pequeno pisava no primeiro degrau da escadaria descendo ao jardim, fugia o unicórnio para o escuro da floresta.
Um dia, indo o Rei de manhã cedo visitar a filha em seus aposentos, viu o unicórnio na moita de lírios.
Quero esse animal para mim. E imediatamente ordenou a caçada.
Durante dias o Rei e seus cavaleiros caçaram o unicórnio nas florestas e nas campinas. Galopavam os cavalos, corriam os cães e, quando todos estavam certos de tê-lo encurralado, perdiam sua pista, confundindo-se no rastro.
Durante noites o rei e seus cavaleiros acamparam ao redor de fogueiras ouvindo no escuro o relincho cristalino do unicórnio.
Um dia, mais nada. Nenhuma pegada, nenhum sinal de sua presença. E silêncio nas noites.
Desapontado, o rei ordenou a volta ao castelo. E logo ao chegar foi ao quarto da filha contar o acontecido. A princesa penalizada com a derrota do pai, prometeu que dentro de três luas lhe daria o unicórnio de presente.
Durante três noites trançou com fios de seus cabelos uma rede de ouro. De manhã vigiava a moita de lírios do jardim. E no nascer do quarto dia , quando o sol encheu com a primeira luz os cálices brancos, ela lançou a rede aprisionando o unicórnio.
Preso nas malhas de ouro, olhava o unicórnio aquela que mais amava, agora sua dona, e que dele nada sabia.
A princesa aproximou-se. Que animal era aquele de olhos tão mansos retido pela artimanha de suas tranças? Veludo do pelo, lacre dos cascos, e desabrochando no meio da testa, espinho de marfim, o chifre único que apontava ao céu.
Doce língua de unicórnio lambeu a mão que o retinha. A princesa estremeceu, afrouxou os laços da rede, o unicórnio ergueu-se nas patas finas.
Quanto tempo demorou a princesa para conhecer o unicórnio? Quantos dias foram precisos para amá-lo?
Na maré das horas banhavam-se de orvalho, corriam com as borboletas, cavalgavam abraçados. Ou apenas conversavam em silêncio de amor, ela na grama, ele deitado aos seus pés, esquecidos do prazo.
As três luas porém já se esgotavam. Na noite antes da data marcada o rei foi ao quarto da filha lembrar-lhe a promessa. Desconfiado, olhou nos cantos, farejou o ar. Mas o unicórnio comia lírios tinha cheiro de flor, e escondido entre os vestidos da princesa confundia-se com os veludos, confundia-se com os perfumes.
Amanhã é o dia. Quero sua palavra comprida, disse o rei- virei buscar o unicórnio ao cair do sol.
Saído o rei, as lágrimas da princesa deslizaram no pelo do unicórnio. Era preciso obedecer ao pai, era preciso manter a promessa. Salvar o amor era preciso.
Sem saber o que fazer, a princesa pegou o alaúde, e a noite inteira cantou sua tristeza. A lua apagou-se. O sol mais uma vez encheu de luz as corolas. E como no primeiro dia em que haviam se encontrado a princesa aproximou-se do unicórnio. E como no segundo dia olhou-o procurando o fundo de seus olhos. E como no terceiro dia aproximou a cabeça do seu peito, com suava força, com força de amor empurrando, cravando o espinho de marfim no coração, enfim florido.
Quando o rei veio em cobrança da promessa, foi isso que o sol morrente lhe entregou, a rosa de sangue e um feixe de lírios.

( Marina Colassanti )

UMA IDÉIA TODA AZUL.

Um dia um rei teve uma idéia.
Era a primeira da vida toda, e tão maravilhado ficou com aquela idéia toda azul, que não quis saber de contar aos ministros. Desceu com ela para o jardim, correu com ela nos gramados, brincou com ela de esconder entre outros, pensamentos, encontrando-a sempre com igual alegria, linda idéia dele toda azul.
Brincaram até o Rei adormecer encostado numa árvore.
Foi acordar tateando a coroa e procurando a idéia, para perceber o perigo. Sozinha no seu sono, solta e tão bonita, a idéia poderia ter chamado a atenção de alguém. Bastaria esse alguém pega-la e levar. É tão fácil roubar uma idéia. Quem jamais saberia que já tinha dono?
Com a idéia escondida debaixo do manto, o Rei voltou pra o castelo. Esperou a noite. Quando todos os olhos se fecharam, saiu dos seus aposentos, atravessou salões, desceu escadas, subiu degraus, até chegar ao Corredor das Salas do Tempo.
Portas fechadas, e o silêncio.
Que sala escolher?
Diante de cada porta o Rei parava, pensava, e seguiu a diante. Até chegar à Sala do Sono.
Abriu. Na sala alcochoada os pés do Rei afundavam até o tornozelo, o olhar se embaraçava em gazes, cortinas e véus pendurados como teias. Sala de quase escuro, sempre igual. O Rei deitou á idéia adormecida na cama de marfim, baixou o cortinado, saiu e trancou a porta.
A chave prendeu no pescoço em grossa corrente. E nunca mais mexeu nela.
O tempo correu seus anos. Idéias o Rei não teve mais, nem sentiu falta, tão ocupado estava em governar. Envelhecia sem perceber, diante dos educados espelhos reais que mentiam a verdade. Apenas, sentia-se mais triste e mais só, sem que nunca mais tivesse tido vontade de brincar nos jardins.
Só os ministros viam a velhice do Rei. Quando a cabeça ficou toda branca, disseram-lhe que já podia descansar, e o liberaram do manto.
Posta a coroa sobre a almofada, o Rei logo levou a mão à corrente.
- Ninguém mais se ocupa de mim – dizia atravessando salões e descendo escadas a caminho das Salas do Tempo – ninguém mais me olha. Agora posso buscar minha linda idéia e guarda-la só para mim.
Abriu a porta, levantou o cortinado.
Na cama de marfim, a idéia dormia azul como naquele dia.
Como naquele dia, jovem, tão jovem, uma idéia menina. E linda. Mas o Rei não era mais o Rei daquele dia. Entre ele e a idéia estava todo o tempo passado lá fora, o tempo todo parado na Sala do Sono. Seus olhos não viam na idéia a mesma graça. Brincar não queria, nem rir. Que fazer com ela? Nunca mais saberiam estar juntos como naquele dia. Sentado na beira da cama o Rei chorou suas duas últimas lágrimas, as que tinha guardado para a maior tristeza.
Depois baixou o cortinado, e deixando a idéia toda adormecida, fechou para sempre a porta.

(Marina Colassanti )

NÃO FALE NADA DE MAU.


As culturas indígenas tribais do mundo inteiro praticam formas de etiquetas tão individuais e diversas como as próprias tribos.

Um fio comum e muitas tribos é a prática de não dizer nada que seja prejudicial.

Os hábitos de trabalhar em silêncio ou cantar durante o trabalho e usar histórias para satisfazer a necessidade da comunidade de se juntar em grupos, não deixam espaço para as conversas descuidadas e o veneno do mexerico.

A compreensão de que todas as palavras refletem e criam energia positivas e negativa nos mundos invisíveis impede que a tagarelice negativa introduza a discórdia na vida cotidiana.

Ao usar o silêncio como forma de ser, as tribos adquirem mentes límpidas, que permitem a visão da energia.

Desta forma, os outros mundos que existem dentro da natureza ficam abertos, por causa do silêncio, e conseqüentemente passa a haver mais harmonia dentro da tribo.

Quando não se perde energia com negatividade, temos inspiração ilimitada para criar danças, história e cerimônias que comemoram o papel de cada indivíduo como um respeitado membro da tribo.


por Jamie Sams.

A ÁGUIA E O FALCÃO.


Conta uma velha lenda dos índios Sioux que uma vez Touro Bravo, o mais valente e honrado de todos os jovens guerreiros, e Nuvem Azul, a filha do cacique, uma das mais formosas mulheres da tribo, chegaram de mãos dadas até a tenda do velho feiticeiro da tribo.


- Nós nos amamos e vamos nos casar, disso o jovem. E nos amamos tanto que queremos um feitiço, um conselho, ou um talismã...alguma coisa que nos garanta que poderemos ficar sempre juntos... que nos assegure quer estaremos um ao lado do outro até encontrarmos a morte. Há algo que possamos fazer?

E o velho emocionado ao vê-los tão jovens, tão apaixonados e tão ansiosos por uma palavra, disse:

- Tem uma coisa a ser feita, mas é uma tarefa muito difícil e sacrificada...Tu, Nuvem Azul, deves escalar o monte ao norte dessa aldeia, e apenas com uma rede e tuas mãos, deves caçar o falcão mais vigoroso do monte... e trazê-lo aqui com vida, até o terceiro dia depois da lua cheia. E tu, Touro Bravo, continuou o feiticeiro, deves escalar a montanha do trono, e lá em cima, encontrarás a mais brava de todas as águias, e somente com as tuas mãos e uma rede, deverás apanhá-la trazendo-a para mim, viva!


Os jovens abraçaram-se com ternura, e logo partiram para cumprir a missão recomendada...

No dia estabelecido, à frente da tenda do feiticeiro, os dois esperavam com as aves dentro de um saco. O velho pediu, que com cuidado as tirassem dos sacos... e viu que eram verdadeiramente formosos exemplares...


- E agora o que faremos? Perguntou o jovem. Nós as matamos e depois bebemos a honra de seu sangue? Ou cozinhamos e depois comemos o valor da sua carne? – Propôs a jovem.

- Não! – Disse o feiticeiro. Apanhem as aves, e amarrem-nas entre si pelas patas com essas fitas de couro...quando as tiverem amarradas, soltem-nas, para que voem livres...

O guerreiro e a jovem fizeram o que lhes foi ordenado e soltaram os pássaros. A águia e o falcão tentaram voar mas apenas conseguiram saltar pelo terreno. Minutos depois, irritadas pela incapacidade do vôo, as aves arremessavam-se entre si, bicando-se até se machucar.


E o velho disse:

- Jamais esqueçam o que estão vendo... este é o meu conselho. Vocês são como a águia e o falcão... se estiverem amarrados um ao outro, ainda que por amor, não só viverão arrastando-se, como também, cedo ou tarde, começarão a machucar-se um ao outro... Se quiserem que o amor entre vocês perdure, VOEM JUNTOS, MAS JAMAIS AMARRADOS...

SABEDORIA INDÍGENA.



"Diz a sabedoria indígena que quando não cumprimos o que prometemos,

o fio de nossa ação que deveria estar concluída e amarrada em algum lugar

fica solto ao nosso lado. Com o passar do tempo, os fios soltos enrolam-se

em nossos pés e impedem que caminhemos livremente...ficamos amarrados

às nossas próprias palavras. Por isso os nativos tem o costume de:

"por-as-palavras-a-andar" que significa agir de acordo com o que se fala;

isso conduz à integridade entre o pensar, o sentir e o agir no mundo e nos

conduz ao Caminho da Beleza onde há harmonia e prosperidade naturais."

EU SEI, MAS NÃO DEVIA.


Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamento de fundos
e a não ter outra vista que não seja as janelas ao redor.

E porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora.
E porque não olha para fora logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas.
E porque não abre as cortinas logo se acostuma acender mais cedo a luz.
E a medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.

A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora.
A tomar café correndo porque está atrasado.
A ler jornal no ônibus porque não pode perder tempo da viagem.
A comer sanduíche porque não dá pra almoçar.
A sair do trabalho porque já é noite.
A cochilar no ônibus porque está cansado.
A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.

A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra.
E aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja número para os mortos.
E aceitando os números aceita não acreditar nas negociações de paz,
aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.

A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir.
A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta.
A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.
A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita.
A lutar para ganhar o dinheiro com que pagar.

E a ganhar menos do que precisa.
E a fazer filas para pagar.
E a pagar mais do que as coisas valem.
E a saber que cada vez pagará mais.
E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas que se cobra.

A gente se acostuma a andar na rua e a ver cartazes.
A abrir as revistas e a ver anúncios.
A ligar a televisão e a ver comerciais.
A ir ao cinema e engolir publicidade.
A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.
A gente se acostuma à poluição.

As salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro.
A luz artificial de ligeiro tremor.
Ao choque que os olhos levam na luz natural.
Às bactérias da água potável.
A contaminação da água do mar.
A lenta morte dos rios.

Se acostuma a não ouvir o passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães,
a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais para não sofrer.

Em doses pequenas, tentando não perceber, vai se afastando uma dor aqui,
um ressentimento ali, uma revolta acolá.
Se o cinema está cheio a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço.
Se a praia está contaminada a gente só molha os pés e sua no resto do corpo.

Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana.
E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo
e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.

A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele.
Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se
da faca e da baioneta, para poupar o peito.
A gente se acostuma para poupar a vida que aos poucos se gasta e, que gasta,
de tanto acostumar, se perde de si mesma.


- Marina Colassanti -

( "Eu sei, mas não devia" , Editora Rocco - Rio de Janeiro, 1996)

A MOÇA TECELÃ.


Acordava ainda no escuro, como se ouvisse o sol chegando atrás das beiradas da noite. E logo sentava-se ao tear.
Linha clara, para começar o dia. Delicado traço cor da luz, que ela ia passando entre os fios estendidos, enquanto lá fora a claridade da manhã desenhava o horizonte.
Depois lãs mais vivas, quentes lãs iam tecendo hora a hora, em longo tapete que nunca acabava.
Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas, a moça colocava na lançadeira grossos fios cinzentos do algodão mais felpudo. Em breve, na penumbra trazida pelas nuvens, escolhia um fio de prata, que em pontos longos rebordava sobre o tecido. Leve, a chuva vinha cumprimentá-la à janela.
Mas se durante muitos dias o vento e o frio brigavam com as folhas e espantavam os pássaros, bastava à moça tecer com seus belos fios dourados, para que o sol voltasse a acalmar a natureza.
Assim, jogando a lançadeira de um lado para o outro e batendo grandes pentes do tear para a frente, a moça passava seus dias.
Nada lhe faltava. Na hora da fome tecia um lindo peixe, com cuidado de escamas. E eis que o peixe estava na mesa, pronto para ser comido. Se sede vinha, suave era a lã da cor de leite que entremeava o tapete. E à noite, depois de lançar seu fio de escuridão, dormia tranqüila.
Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo o que queria fazer.
Mas tecendo e tecendo, ela própria trouxe o tempo em que se sentiu sozinha, e pela primeira vez pensou como seria bom ter um marido ao lado.
Não esperou o dia seguinte. Com capricho de quem tenta uma coisa nunca conhecida, começou a entremear no tapete as lãs e as cores que lhe dariam companhia. E aos poucos seu desejo foi aparecendo, chapéu emplumado, rosto barbado, corpo aprumado, sapato engraxado. Estava justamente acabando de entremear o último fio da ponta do sapato, quando bateram à porta.
Nem precisou abrir. O moço meteu a mão na maçaneta, tirou o chapéu de pluma, e foi entrando na sua vida.
Aquela noite, deitada contra o ombro dele, a moça pensou nos lindos filhos que teceria para aumentar ainda mais a sua felicidade.
E feliz foi, por algum tempo. Mas se o homem tinha pensado em filhos, logo os esqueceu. Porque, descoberto o poder do tear, em nada mais pensou a não ser nas coisas todas que ele poderia lhe dar.
- Uma casa melhor é necessária – disse para a mulher. E parecia justo, agora que eram dois. Exigiu que escolhesse as mais belas lãs cor de tijolo, fios verdes para os batentes, e pressa para a casa acontecer.
Mas pronta a casa, já não lhe pareceu suficiente. – Por que ter casa, se podemos ter palácio? – Perguntou.Sem querer resposta, imediatamente ordenou que fosse de pedra com arremates de prata.
Dias e dias, semanas e meses trabalhou a moça tecendo tetos e portas, e pátios e escadas, e salas e poços. A neve caía lá fora, e ela não tinha tempo para chamar o sol. A noite chegava, e ela não tinha tempo para arrematar o dia. Tecia e entristecia, enquanto sem parar batiam os pentes acompanhando o ritmo da lançadeira.
Afinal o palácio ficou pronto. E entre tantos cômodos, o marido escolheu para ela e seu tear o mais alto quarto da mais alta torre.
- É para que ninguém saiba do tapete – disse. E antes de trancar a porta a chave advertiu: - faltam as estrebarias. E não se esqueça dos cavalos!
Sem descanso tecia a mulher os caprichos do marido, enchendo o palácio de luxos, os cofres de moedas, as salas de criados. Tecer era tudo o que fazia. Tecer era tudo que o queria fazer.
E tecendo, ela própria trouxe o tempo em que sua tristeza lhe pareceu maior que o palácio com todos os seus tesouros. E pela primeira vez pensou como seria bom estar sozinha de novo.
Só esperou anoitecer. Levantou-se enquanto o marido dormia sonhando com novas exigências. E descalça para não fazer barulho, subiu a longa escada da torre, sentou-se ao tear.
Desta vez não precisou escolher linha nenhuma. Segurou a lançadeira ao contrário, e, jogando-a veloz de um lado para o outro, começou a desfazer seu tecido. Desteceu os cavalos, as carruagens, as estrebarias, os jardins. Depois desteceu os criados e o palácio e todas as maravilhas que continha. E novamente se viu na casa pequena e sorriu para o jardim além da janela.
A noite acabava quando o marido, estranhando a cama dura, acordou, e espantado olhou em volta. Não teve tempo de se levantar. Ela já desfazia o desenho escuro dos sapatos, e ele viu seus pés desaparecendo, sumindo as pernas. Rápido, o nada subiu-lhe pelo corpo, tomou o peito aprumado, o emplumado chapéu.
Então, como se ouvisse a chegada do sol, a moça escolheu linha clara. E foi passando-a devagar entre os fios, delicado traço de luz, que a manhã repetiu na linha do horizonte.

( Marina Colassanti )

domingo, 23 de agosto de 2009

A BRUXA.

A bruxa é um ser fantástico do mal, que persegue os outros seres fantásticos, seres humanos e os bichos da fauna natural.
Ela tem uma cara horripilante. Anda com roupas imundas e carrega um saco nas costas ou amarrado na cintura.
Costuma viver em ambientes úmidos e escuros, cercada de animais nojentos como baratas, cobras, escorpiões, carrapatos, ratos
, morcegos, piolhos e vários tipos de mosquitos, como a mosca-varejeira, a muriçoca e os borrachudos.
A bruxa é originária
de alguns países do mundo. Na Grécia eram famosas bruxas como Hécate e suas filhas Circe e Medeia.
Na Inglaterra, Alemanha, Itália, França, nos países nórdicos e do leste europeu
proliferaram bruxas durante a Idade Média.
Em cada vilarejo havia uma bruxa ou feiticeira atormentando a vida dos camponeses, artesãos e princesas.
Se, como dizem, a Idade Média foi a Idade das Trevas, as bruxas foram a sua sombra.
Traziam consigo a peste, a fome e as guerras. Muitas pessoas inocentes foram queimadas na fogueira sob a crença de que eram bruxas, como Joana D’Arc, na França.

Em cada continente há uma raça de bruxa assustando as crianças. No Brasil existe a Cuca, mulher do bicho-papão, que é mencionada nas cantigas de ninar, como nesta: "dorme, nenê que a cuca já vem já. Papai foi na roça, mamãe no cafezá".
A Cuca anda mais por São Paulo, Goiás, Pernambuco, Rio de Janeiro e Espírito santo. Aparece nos demais estados com outros nomes. Às vezes vem acompanhada de um bruxo chamado tutu-marambá, tutu-zambeta ou tutu-do-mato. Ao contrário do que se pensa, não é difícil afastar uma bruxa. Há os esconjuros ou rezas para exorcizar, para expulsá-las de um lugar.
Há alguns recursos
práticos, como colocar sal na entrada da casa ou deixar uma tesoura de aço aberta em cima da mesa da cozinha.
Pode-se deixar também uma vassoura atrás da porta, mas há o perigo da bruxa roubar a vassoura para voar. É aconselhável não ter em casa plantas que atraem os seres maus, como a gameleira, o fedegoso ou o jenipap
o.Boas plantas para afastá-los são a japecanga e a arruda.
Eles não agüentam o cheiro da arruda. Aliás, ninguém agüenta...

Tradi
cionalmente a comida predileta das bruxas é a sopa de miúdos de porcaria.
Nessa sopa entra de tudo: perna de rã, rabo de cobra, minhoca, unha de macaco, banha de porco-espinho, miúdos de anta, alho, sal grosso, pimenta malagueta e toucinho.
È nessa sopa que elas colocam as suas vítimas, humanas ou não, para “engrossar o caldo”.

As
bruxas tornaram-se populares a partir de suas participações nos contos de fada como personagens coadjuvantes ou secundárias.
Em “João e Maria” há uma velha ardilosa que constrói uma casa de doce para atrair os dois irmãos.
Em “Branca de Neve” a madrasta é uma verdadeira bruxa, com seu espelho mágico e com mania de mandar maçã para Branca, ainda por cima envenenada.
Atualmente existem bruxas? Em grande quantidade. Entretanto tornaram-se inofensivas diante de tanta violência das cidades.
Algumas irmãs como Malva, Malvina e Malvona, preferem, a sair na rua, ficar em casa assistindo às novelas, fazendo tricô e
lendo histórias de terror.